Deve ser votado hoje, na Câmara dos Deputados, um projeto de lei (clique aqui e confira o projeto), proposto pelo deputado federal Carlos Sampaio (PSDB/SP), que autoriza cortes nos salários dos servidores públicos federais. De acordo com o projeto, quem ganha entre R$ 5 mil e R$ 10 mil, terá um corte de 10% em seus salários; quem ganha acima de R$ 10 mil, o corte vai variar de 20 a 50%.
Para tentar disfarçar a violência da medida com o trabalhador diante de um cenário catastrófico no país com a pandemia do corona vírus, o projeto inclui cortes nos salários dos parlamentares e membros de alto escalão de todos os poderes da União e usa como justificativa que o dinheiro não gasto com os cortes salariais será redirecionado integralmente ao Ministério da Saúde para ações e serviços da saúde pública para o combate à pandemia.
Outro disfarce do impacto é excluir dos cortes salariais os profissionais da saúde e da segurança pública que estão atuando na linha de frente neste período de pandemia.
Enquanto estes dados servem de eufemismo para insuflar a solidariedade do brasileiro, o discurso do “todos temos que contribuir” não se aplica aos bancos. Na última segunda, dia 23, o Banco Central (BC) anunciou um pacote que vai liberar R$ 1,216 trilhão para os bancos, o equivalente a 16,7% do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil. Para se ter uma ideia dessa dimensão, na crise financeira de 2008, os bancos receberam um montante de 117 bilhões de reais, o que correspondeu a 3,5% do PIB. O pacote anunciado dia 23 é 10 vezes mais que o de 2008. Este dinheiro vai ser usado para disponibilizar crédito (empréstimo) ao brasileiro e a conta já inclui uma reserva de proteção à inadimplência.
O discurso enganoso também não se aplica ao grande empresariado brasileiro. A flexibilização de leis trabalhistas permitida pela Medida Provisória 927 (MP 927), publicada no último dia 22 numa edição extra do Diário Oficial da União (DOU), atingem o trabalhador privado e isenta o empresariado de ‘cota de sacrifício’.
Com a MP 927, pode-se criar uma espécie de banco de horas a serem compensadas futuramente. Isso pode acontecer com a suspenção da jornada de trabalho e antecipação de feriados, que serão compensados quando a situação se normalizar. Traduzindo: todos vão trabalhar sem interrupções.
Férias individuais ou coletivas podem ser antecipadas. Traduzindo: todos vão trabalhar sem interrupções.
O cumprimento de regras de segurança e saúde no trabalho estão suspensas. Traduzindo: todos vão trabalhar sem interrupções e em condições insalubres.
Outro item que pode entrar em vigor em breve é a redução de jornada de trabalho, acompanhada da redução de salários.
A MP 927 ainda previa a suspensão dos contratos de trabalho, e do pagamento de salários por consequência, durante quatro meses. A ideia foi tão criticada por tantos setores que foi retirada da MP.
Derrocada
Com as ações dos últimos dias, é possível traçar o caminho de destruição que o trabalhador brasileiro vai trilhar a partir desta pandemia. O brasileiro está perdendo empregos, perdendo fonte de renda e de sustento, tendo corte de salários.
Empobrecido, o brasileiro logo, logo se verá sem condições para honrar compromissos já assumidos e precisará de crédito (empréstimo) para tentar manter o que conquistou ou apenas sobreviver e conseguir colocar alimento em casa.
O brasileiro está sendo transformado num grande endividado e os bancos estão sendo preparados para garantir isso. E como não conseguir arcar com estes empréstimos é uma realidade possível, os bancos já estão devidamente protegidos desta inadimplência nestes R$ 1,216 trilhão que vão receber.
Irresponsabilidade
Enquanto o projeto de lei do deputado federal Carlos Sampaio (PSDB/SP), que deve ser votado hoje na Câmara dos Deputados, traz no discurso um reconhecimento dos esforços dos trabalhadores da saúde e da segurança, excluindo-os dos cortes salariais, o presidente Jair Bolsonaro demonstra desacordo nesse ponto.
Em pronunciamento incoerente na noite de ontem (clique aqui e confira o pronunciamento), dia 24, ele tratou a pandemia como “uma gripezinha, um resfriadinho”, conclamando a sociedade a sair da quarentena e voltar à normalidade, apesar de ter iniciado sua fala pedindo que a população siga as orientações do Ministério da Saúde, que demanda justamente que a população se resguarde em casa, para não implodir o sistema de saúde e preservar os profissionais de saúde e de segurança que não podem entrar em quarentena para cuidar da população.
Uma atitude irresponsável desta dimensão é inadmissível num chefe de uma nação, que foi condenada pela população, que considerou o pronunciamento um discurso genocida.